A essência do Trabalho Espagírico apoia-se na estreita colaboração entre dois seres: a Natureza e o Operador.
No âmbito da alquimia, a planta deve ser tratada como um ser inteligente e com o máximo respeito. Por isso, devemos pedir sua permissão antes de iniciar o trabalho. Pela mesma lógica que não devemos forçar uma pessoa a efetuar um trabalho em comum que não escolheu fazer e que não tenha nenhum interesse…
Do contrário, seu elixir poderá não apresentar os resultados esperados. Se é que conseguirá terminá-lo.
Inicia-se pela morte
Por mais estranho que pareça, o início do trabalho na espagiria alquímica começa pela “morte”. Também é verdade para todos os reinos e pode parecer inconcebível que possa ajudar um ser matando-o.
Para renascer devemos, primeiramente, morrer. Neste caso, o alquimista torna-se um sacrificador.
O sacrifício iniciático provoca uma renúncia: Devemos fazer o vegetal evoluir de um estado existencial “impuro” para outro que seja melhor. Isto só é possível de se fazer passando pela porta da morte.
O operador sensível sabe que não é somente a planta que irá passar por esta porta.
Já que o trabalho do laboratório tem profundas repercussões sobre o alquimista, este último também deverá aceitar viver um duelo em contato com as qualidades da planta com a qual trabalha.
Por exemplo, a flor de lis (símbolo de poder, soberania, honra, lealdade, pureza de corpo e alma), que rege as relações entre casais, em diversos níveis, irá aflorar verdades, esclarecimentos ou desilusões na vida sentimental do alquimista.
Se ele mantém uma relação amorosa nefasta ou mentirosa, a energia da Lis irá cooperar para restabelecer o equilíbrio.
Este gênero de acontecimentos é frequentemente vivido como uma morte porque livra-se de velhos comportamentos obsoletos do passado.
Separa-se as partes
Em um jogo de quebra-cabeça, a primeira coisa que fazemos é separar o amontoado de peças em grupos. Escolhemos e colocamos juntas as cores dominantes.
De forma semelhante, é o que faz a natureza quando um corpo morto é decomposto.
Assistimos a desarticulação das partes constituintes de seu metabolismo, tal como os fluidos, os gases e as partes mais sólidas.
Um corpo em decomposição se transforma, aparentemente, de modo incoerente enquanto este segue a ordem dos elementos da natureza.
Os alquimistas denominaram este fenômeno de caos.
Podemos, com efeito, alcançar uma nova ordem das coisas passando por um nível de desordem. De onde surgiu a expressão: o caos precede a ordem.
Solve
Os alquimistas denominaram a sua primeira operação (na verdade, é um grupo de operações) como solve. É uma palavra latina que significa separar, dissolver.
Os constituintes da planta serão separados e purificados isoladamente: extração dos óleos essenciais, fermentação, destilação e purificação do espírito (álcool), incineração, calcinação, obtenção e purificação do sal da planta.
Os Três Princípios
Esta separação dos elementos vegetais é comparável a uma dissolução que se produz no momento de uma putrefação.
Observando o resultado desta experiência, os alquimistas determinaram que três elementos principais ou princípios filosóficos coexistem em todos os corpos. Cada princípio filosófico recebeu o nome de Enxofre, Mercúrio e Sal.
Para conhecer mais sobre cada princípio filosófico, acesse nosso outro artigo, especificamente sobre este tema.
A fase solve é uma separação que envolve muito mais que os elementos químicos da matéria.
Ela corresponde, sobretudo, à separação global do ser vegetal. De modo semelhante a um ser humano que falece, a planta que morre libera seu corpo, sua alma e seu espírito.
Na alquimia, considera-se que:
- O Mercúrio é o espírito
- O Enxofre é a alma
- O Sal é o corpo
As três matérias
Concretamente, obtemos três matérias que se pode relacionar, simbolicamente, com os três princípios alquímicos.
Não há o que confundir, pois uma matéria corresponde a um princípio:
- O Mercúrio é o álcool da planta
- O Enxofre (ânima) é o óleo essencial
- O Sal é o sal salis contido nas cinzas
É importante compreender que os três princípios alquímicos ou filosóficos englobam as virtudes da planta.
Os Antigos escolheram estes três termos devido às propriedades particulares dos corpos químicos que os designam.
O mercúrio é um metal fundido à temperatura ambiente. É uma exceção entre os metais. O que reforça seu simbolismo. É também um metal que tem a particularidade de formar, facilmente, uma liga com outros metais.
Esta característica o dota da propriedade arquetípica de acordo com o que queriam atribuir os Antigos com o termo espírito.
Por esse motivo o álcool foi chamado de água da vida. O Mercúrio alquímico ou espírito representa a vida que circula pela matéria, universalmente.
Alquimicamente falando, considera-se que o Mercúrio é capaz de receber uma impressão ou uma assinatura. É o que ocorre, por exemplo, quando preparamos uma boa tintura espagírica ou outro elixir mais sutil.
A semente que confere a personalidade da planta é o óleo essencial ou a alma do vegetal. É, pois, a alma ou Enxofre que modela o Mercúrio para dar-lhe uma forma, ao ser retido pelo princípio Sal.
No reino vegetal esta impressão do Enxofre determina o gosto, o perfume e boa parte das qualidades terapêuticas de uma planta.
E, finalmente, havendo observado que todo sal mineral é ávido por umidade, os alquimistas deram ao corpo o nome de sal.
Podemos concluir que todos os vegetais possuem o mesmo Mercúrio (já que é o espírito de vida) em um corpo relativamente neutro. Sendo o Enxofre o elemento que irá distinguir um ser de outro.
As primeiras operações consistem em separar os três princípios: o princípio vida ou Mercúrio, o caráter ou Enxofre e o Corpo ou Sal.
Sabemos que uma planta, como todos os seres, é uma das numerosas manifestações do espírito universal.
Em sua viagem do céu até a terra, sofre alterações que o transformam em uma ou outra das coisas existentes (mineral, metal, vegetal ou animal). Este espírito impregna-se de impurezas.
As operações do solve abre a matéria em seus três princípios filosóficos. Ao mesmo tempo, livra-os das impurezas, conduzindo a um estado mais elevado.
Quem se dedica às práticas no laboratório alquímico sabe que a maior parte do tempo é utilizada para a preparação das matérias.
Em outro artigo, abordarei o significado da segunda metade das operações da espagiria alquímica: o coagula, que trata da reunificação dos três princípios na forma de elixires com elevadíssima capacidade energética e terapêutica. Superiores a qualquer outro preparado natural que você conheça.
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Solve et coagula
“Numa alusão à obra divina da criação e ao projeto de redenção nela contido, o processo alquímico foi designado por “Grande Obra”. Nesse processo, uma matéria inicial, misteriosa e caótica, chamada matéria prima, em que os opostos se encontram ainda inconciliáveis num conflito violento, deve ser transformada progressivamente num estado de libertação de harmonia perfeita, a “Pedra Filosofal” (a Lida dos Filósofos) redentora ou o lapis philosophorum: “Primeiro, combinamos, em seguida decompomos, dissolvemos o decomposto, depuramos o dividido, juntamos o purificado e solidificamo-lo. Deste modo, o homem e a mulher transformam-se num só.” Magnum opus-Wikipédia – Solve et labora
obrigado Daniel Fidélis o seu trabalho é otimo me ajudou muito parabens. sucesso saude e paz. gratidao.
Assim também é para nós acredito eu, quando renunciamos algumas crenças e padrões para acreditar em algo novo sera como se morressemos para algo antigo e nascessemos para algo novo.
E o senhor professor nos proporciona isto… gratidão
Excelente!!!
Otimo
Muito Obrigada Daniel Fidelis, conteúdo excelente, Profundo , com muitas informações e qualidade na Abordagem da Alquimia